segunda-feira, 3 de outubro de 2011

O grau de nossa dependência

Só entrei pra postar esse texto, que eu achava que estava perdido, mas encontrei em pastas escondidas no PC. Foi produzido para o Jornal Comunicação Impresso de 2009, que nunca foi impresso. Esse texto, portanto, nunca saiu do meu computador ou do computador do meu editor.
Fala de um desafio pelo qual eu passei, de ficar cinco dias sem tecnologia.
Aí está:

O GRAU DE NOSSA DEPENDÊNCIA

Os meus dias costumam depender diretamente de meios de comunicação. Acordo pela manhã ao som das notícias matinais no rádio, incluindo previsão de tempo e informações de trânsito (que seriam mais úteis caso tivesse carro). Uma checada rápida na caixa de entrada do e-mail antes de sair de casa é fundamental para saber se terei alguma atribuição relativa à faculdade ou ao próprio jornal laboratório. Uma vez ouvi (minto, li na lista de e-mails) de outro estudante mais experiente que “nós somos estudantes de comunicação e não há desculpas para não olharmos os e-mails mais de duas vezes por dia”. É a dura sina de quem optou por estar relacionado aos meios de comunicação para o resto da vida.

Não sei que motivo me levou a aceitar o desafio de passar cinco dias inteiros sem utilizar meios de comunicação. Talvez seja para saber o meu grau de dependência da tecnologia. Ou, quem sabe, para divertir os meus futuros leitores com a minha angústia. Fato é que tive que me desligar do mundo por 120 horas.

Optei por começar a carregar essa cruz numa sexta-feira de manhã. Passar um fim de semana incomunicável parecia mais desafiador. Olhei meu e-mail pela última vez por volta das dez horas. Durante o resto do dia, evitei o contato visual com a telinha brilhosa e hipnotizante da televisão. Desliguei o meu celular e abandonei-o na gaveta do guarda-roupa. Preparei minha mente e meu corpo para resistir à tentação de sequer entrar na sala do computador.

Os problemas começaram a surgir já na sexta à noite. Como se não bastasse o som do noticiário esportivo que vinha da televisão - que pela primeira vez na vida eu percebi que se assemelhava ao canto das sereias - o dia seguinte me reservava a possibilidade de ir ao aniversário de um grande amigo. E, como ficamos de combinar por MSN onde seria a comemoração, fiquei a ver navios. No final das contas, uma gripe fulminante e cambaleante me derrubou na cama, onde passei o sábado inteiro. Acho que os sintomas da crise de abstinência de Orkut começavam a aparecer.

Chego ao domingo de maneira incomum. Como não saí e nem fiquei conversando pela internet no sábado até mais tarde, levantei da cama às oito horas (quase de madrugada, para os meus padrões). Tomei café e fui ler algum livro até o resto da família acordar e eu começar a me ocupar. Foi quando o segundo grande problema surgiu: como farei para acompanhar o jogo do Atlético? Sem TV, sem rádio, sem internet. O jeito é desembolsar o valor do ingresso (meu e do meu irmão mais novo, que não me permitiu ir ao jogo sozinho) e rezar pela sorte.

Acabou que a vitória do meu time (3x2 sobre o Internacional) me deixou mais animado e comecei a ver essa difícil tarefa com bons olhos. Um mundo de novas atividades passou a figurar em minha cabeça e a mudar minha rotina. Conversei com muita gente sobre a tarefa e ouvi diversas histórias e comentários.

Uma moça muito simpática me contou a história de sua mãe, que costumava freqüentar a casa de uma tia para reunir-se na varanda com as outras mulheres da família e simplesmente conversar sobre assuntos diversos. Quando ela e o resto da família adquiriram o revolucionário aparelho televisivo e foram inseridas no mundo das telenovelas, essas conversas nunca mais ocorreram.

Ouvir aos diálogos de outras pessoas no ônibus também foi interessante. Geralmente, o som que embala minhas viagens sai do fone de ouvido ligado ao celular. Dessa vez, fui obrigado a escutar os pedidos de doações e o sistema de som desregulado do biarticulado que anunciava equivocadamente os nomes das “próximas paradas”.

No final das contas, segunda e terça-feira passaram mais rapidamente do que eu imaginava e não me mostraram muitas novidades. Apenas impuseram dificuldades de me comunicar com meu pai, que precisava de ajuda no “negócio da família” (um bar no Água Verde) e não tinha como me ligar. Não que eu realmente lamentasse esse fato, mas como eu sabia que ele precisaria de um auxílio, eu me deslocava até o bar por livre e espontânea vontade. Lá, tinha que resistir à tentação da televisão e esquivar-me das conversas que envolviam os acontecimentos recentes noticiados na TV, no rádio e na Internet. Tenho a impressão de que ouvi, de relance, os termos “gripe” e “José Sarney”. Só fui entender alguns dias depois.

O fato de estar incomunicável, e ninguém conseguir entrar em contato comigo sem que me abordasse pessoalmente dava-me uma sensação de liberdade e independência. Comecei a notar que são os aparelhos de comunicação que precisam de mim para funcionar, e não o contrário. Pode parecer óbvio, mas apenas quem passar por isso vai entender do que estou falando.

O som da televisão, antes semelhante ao canto das sereias, passou a constituir um ruído incômodo e dispensável. O celular, até então imprescindível, passou a representar um luxo, uma futilidade. A internet, que eu considerava quase uma condição de sobrevivência, passou a figurar entre as simples ferramentas de trabalho ou de entretenimento. Assim como os livros se mostraram muito mais prazerosos que os fóruns do Orkut ou os vídeos do Youtube.

Fui dormir na terça-feira com a sensação de dever quase cumprido. Faltavam algumas horas para abandonar a tarefa. Acredito que mais surpreendente do que passar cinco dias sem comunicação foi recuperar, assim de uma hora para outra, todo o contato com a tecnologia. Liguei o meu celular e guardei no bolso. Nada de novo, apenas dois números que “ligaram e não deixaram recado”. Sentei na cadeira em frente do computador e senti um estranho conforto. Posicionei a minha mão no mouse e notei como aquele pequeno aparelho se conecta ao nosso corpo parecendo fazer parte de um sexto sentido chamado “hardware”.

Abri minha caixa de e-mails e vi, logo de cara, que algumas páginas eram dedicadas a novas mensagens. Demorei mais tempo filtrando o que prestava do que lendo o que realmente importava. Várias conversas da lista de e-mails, várias propagandas e boletins ultrapassados de sites noticiosos.

As manhãs que eu ocupei lendo e conversando nos dias anteriores deram lugar ao simples hábito de saber as notícias do dia e limpar a caixa de entrada. As noites bem dormidas deram lugar a conversas por MSN que se estendiam até de madrugada. E isso foi fazendo com que as manhãs seguintes fossem ainda menos aproveitadas.

Não vou ser hipócrita a ponto de dizer que vou passar a usar menos a tecnologia. Não. Minha futura profissão não me permite esse luxo. Mas vou começar a fazer esse tipo de jejum durante as férias. E, quem sabe, realizar as atividades citadas nesse texto sem que seja necessário haver uma desculpa para isso.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Mídia x Políticos

Essa é a disputa que parece não ter fim. Sempre que o assunto esfria, surge uma denúncia contra algum figurão de Brasília e esse se defende acusando a mídia de "sensacionalista", "abutres" ou coisas do gênero. Frases populistas usadas desde a Era Vargas. "Não me deixem só, queridos eleitores!"

Hoje, no Dia Internacional da Democracia, ocorreu uma sessão especial no Senado em comemoração à data. No seu discurso, o presidente da casa, José Sarney (esse mesmo), afirmou que a 'mídia é inimiga da democracia'. Para que eu não seja acusado de distorcer as palavras do glorioso presidente, vou postar um trecho do seu comentário:

"A tecnologia, hoje, levou os instrumentos de comunicação a tal nível que, a grande discussão que se trava é justamente esta: quem representa o povo? Diz a mídia: somos nós, e dizemos nós representantes do povo: somos nós. É dessa contradição que existe hoje, um contra o outro, que, de certo modo, a mídia passou a ser uma inimiga das instituições representativas." (trecho retirado do portal Último Segundo, do IG)

Não sou e nunca serei defensor da grande mídia. Não a considero representante do povo. Mas as instituições democráticas precisam ser observadas e fiscalizadas. E nada mais justo que a mídia cumpra com esse papel.

E a visão de que os políticos eleitos são os reais representantes do povo é levemente ingênua. Principalmente se for levado em conta que ela saiu da boca de um dos homens públicos mais experientes e influentes do nosso país. A mídia defende seus interesses, e os políticos defendem os deles. Não há interesse do povo com apenas uma dessas instituições funcionando plenamente, mas a intersecção entre as duas garante o funcionamento de uma sociedade democrática.

Engraçado também como o povo precisa ser representado mas não pode se manifestar diretamente. Se houver toda a regulamentação e proibição de campanhas políticas na internet, como assim o querem os "legítimos representantes do povo", não haverá possibilidade de o povo se manifestar livremente utilizando o meio de comunicação mais abrangente e livre do mundo. Isso é democracia? Será que os políticos, portanto, não estão agindo também contra a democracia?

A Reforma Eleitoral é necessária, mas que a discussão não seja desvirtuada para esse lado.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Anão vestido de palhaço mata oito na Croácia


Um crime aterrorizante assombrou a pacata cidade de Split, na Croácia, nesse domingo, dia 13/09. Um anão, identificado por testemunhas como o humorista Davor Vlasic, assassinou impiedosamente oito dos seus espectadores logo após o seu show.
As causas do crime ainda são desconhecidas, mas especula-se que a principal razão tenha sido o fato de que as vítimas não aplaudiram o palhaço ao fim de sua apresentação. "Eles nem sequer riram das piadas dele!", afirma o chefe de polícia local, Niko Klasnic.
No momento, tanto o assassino quanto a arma do crima (uma bomba de encher balões) encontram-se desaparecidos. O companheiro de shows do homicida, Ivan Kovac, afirmou à polícia que o amigo não pode ter ido muito longe, "afinal de contas, mentira tem perna curta".
As autoridades de todo o país encontram-se em alerta, e pedem para que os cidadãos croatas repassem à polícia qualquer informação acerca do paradeiro do anão. Ao lado, a foto divulgada para a identificação.
(à esq., Kovac, e ao centro, Vlasic, comemorando o Dia Internacional do Palhaço com Nanismo, no Sindicato dos Humoristas Profissionais de Zagreb, em outubro do ano passado.)

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

E a marolinha passou...

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou hoje, 11 de setembro, o crescimento de 1,9% do PIB brasileiro no segundo trimestre de 2009. Isso indica oficialmente que a recessão chegou ao seu fim. Ou, como diria nosso presidente, que "a marolinha já passou".

E como criou polêmica a tal da "marolinha", hein!?! Foi só a declaração sair da boca do Lula que as revistas "Veja" da vida e seus gloriosos leitores ferrenhos desataram a criticar de maneira irrestrita o termo utilizado pelo presidente.

Enquanto nos EUA algumas cidades (sim, eu disse 'cidades') inteiras foram à falência e viraram cidades-fantasma por conta do desemprego gerado pela crise, o Brasil sofreu consequências muito menores. O que confirma isso não é a minha opinião, mas sim os dados. Entre Abril e Junho, enquanto o mundo inteiro ainda discutia métodos de se recuperar da crise, o Brasil já estava crescendo.

A economia mundial baseia-se em confiança e especulação. Enquanto nós temos um presidente que acalma a população e incentiva o consumo, a União Europeia tem presidentes que se desesperam no primeiro sinal de crise e fazem reuniões atrás de reuniões para tentar "mostrar serviço", como se estivessem efetivamente combatendo a crise. O primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, chegou a anunciar a possibilidade de um novo Bretton Woods. E, pasmem caros leitores, a União Europeia continua em recessão!

A crise só afetou, no Brasil, os setores que dependem exclusivamente da exportação, ou seja, da economia externa. Isso prova o quanto nossa economia interna está fortalecida e estável. E, sejamos justos, o único mérito dos últimos presidentes nesse aspecto foi o de não atrapalhar. É a ordem natural das coisas...

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Um sorriso sincero

Minutos, segundos, instantes. No momento em que ocorrem, estas palavras são a pura definição de alguns acontecimentos, aos quais você só passa a dar valor depois que se tornam passado. Pode ser pela maturidade, ou pelo simples fato de se poder refletir a respeito apenas alguns instantes depois, quando se examina melhor o que aconteceu olhando para os resquícios de memória ainda frescos.
Um momento assim ocorreu comigo, ainda em meus tempos de cursinho, quando o conteúdo do vestibular é a única coisa que importa. Quando todos pensamos estar prontos para a vida adulta, mas estamos apenas amadurecendo.
Em mais uma de minhas viagens cursinho-casa, realizada a pé, estava eu lamentando o fato de não ter passado no maldito vestibular logo na primeira tentativa. Reclamando mentalmente do sol forte, que tornava o deslocamento ainda mais cansativo. Xingando baixo porque a barra das minhas calças insistiam em entrar embaixo do sapato.
Já na rua de casa, quando minha mente pensava no hall refrescante do prédio e rezava para que o elevador estivesse me esperando (para que eu não tivesse o angustiante trabalho de esperar por ele ou subir de escada), um objeto, que meus olhos não identificaram de primeira, cruzou a minha frente, rolando pela calçada em direção à rua.
Ao perceber o que era, eu - quase automaticamente - abaixei para juntar. Era uma garrafa de óleo, daquelas "pet", vazia. Juntei a garrafa e me virei para colocá-la no latão de lixo. Para minha surpresa (ou talvez até já esperasse por isso), um garoto, daqueles com idade para estar na escola ou em casa brincando, largou seus afazeres junto aos sacos de lixo e estendeu a mão para receber a garrafa da minha. O fato em si não me surpreende tanto, pois conheço (e abomino) a dura realidade da desigualdade social. O que não sai da minha mente até hoje é o sorriso que recebi em troca de um gesto tão banal.
Um sorriso sincero, animado e ingênuo. Atrevo-me a dizer que foi o sorriso mais convincentemente sincero que já recebi em toda a minha vida.
Não sei se posso descrever fielmente, com palavras, o sentimento que tenho ao lembrar desse acontecimento. Sinto vergonha das minhas reclamações, nojo do meu egoísmo e indignação pelas circunstâncias. O menino que marcou para sempre minha vida poderia estar sorrindo por receber um presente, um livro, um prato de comida, um abraço. Porém, o gesto que eu considerei banal foi o suficiente para extrair aquele sorriso.
Só lamento poder enterder a importância disso somente agora, quando não posso mais encontra-lo e agradecer pela injeção de maturidade.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Os Coadjuvantes do Sistema

No sistema político brasileiro, a cada quatro anos os municípios elegem seus prefeitos e os integrantes de suas Câmaras Municipais. Normalmente, as candidaturas para a prefeitura são mais visadas e geram muito mais discussão na esfera pública. O desempenho do prefeito, os argumentos da oposição e a ligação dos candidatos com os governos estadual e federal são constantemente colocados em pauta na agenda pública.
Mas, e as eleições para vereador? Seriam menos importantes? Por que a composição da Câmara Municipal para os quatro anos seguintes é colocada em segundo plano? O cientista social e professor da Universidade Federal do Paraná Ricardo Costa de Oliveira, em entrevista ao Comunicação, explica melhor a função dos vereadores - papel que é pouco conhecido pelos cidadãos - e a falta de prioridades da Câmara Municipal que, segundo o professor, só se ocupa com “ atividades de utilidade pública e de homenagens”.

Comunicação: Muitas pessoas ainda não sabem qual é o papel dos vereadores e também não têm o conhecimento de como eles se elegem. O vereador seria uma figura secundária no contexto político adotado pelo país?

Ricardo Costa de Oliveira: Na maneira como o sistema político está organizado, o vereador tem uma função subalterna, uma vez que ele está submetido às intenções políticas dos executivos municipais. E as câmaras municipais passaram a ter um papel de coadjuvante no chamado ‘pacto homologatório’, ou seja, as principais políticas que vêm dos prefeitos são aprovadas pelos vereadores sem maiores questionamentos. E as câmaras se dedicam, basicamente, às atividades de utilidade pública e de homenagens. Com isso, há um desvirtuamento do papel do vereador, que deve ser muito mais importante.
O vereador deve, em primeiro lugar, fiscalizar o prefeito e os seus secretários municipais, e votar os orçamentos municipais de maneira mais completa (em relação ao que é feito hoje). Com isso, o vereador passa a formular um projeto de planejamento urbano. Geralmente, eles não fazem isso, pois o pacote vem completo e quase fechado e eles apenas homologam.
Os vereadores também devem votar políticas públicas e legislações, para os municípios. Além de ficarem na utilidade pública e nas homenagens, eles se dedicam a relações baseadas no clientelismo e no assistencialismo. Ou seja, têm gabinetes de atendimento para a população que extrapolam as funções do vereador. Esses gabinetes oferecem cadeiras de rodas, remédios, vantagens, que são importantes pra a população, mas que não correspondem ao papel do vereador.

Comunicação: E o fato de as eleições para vereador serem proporcionais, isso privilegia demais os partidos e prejudica os candidatos?

Oliveira: Depende do caso. Muitas vezes os vereadores procuram vantagens. Em Curitiba, a Câmara Municipal votou um grande reajuste salarial para o prefeito, para o vice, para o presidente da Câmara e para eles mesmos, (que passa a valer) na próxima legislatura, sendo que a maioria se reelege. O prefeito Beto Richa vetou o aumento para prefeito e vice-prefeito porque era ano eleitoral, mas houve um grande aumento, acima das correções, para o presidente da Câmara Municipal, que, com isso, tem muito poder e muita influência. Eles mesmos votaram seu próprio reajuste, o que também desagradou à opinião pública.
De acordo com a ONG Transparência Brasil, o custo per capita por vereador é de cerca de dois milhões de reais ao ano. É muito dinheiro para o que eles fazem. Então, é preciso redimensionar esses gastos, uma vez que esse dinheiro poderia ser mais bem empregado nas áreas carentes da população, nas periferias. Outro dia, eu estava vendo um catador de lixo com sua família no meio do frio e da chuva. O que ele está ganhando da prefeitura ou da Câmara Municipal? O custo de dois milhões por ano, para que os vereadores votem utilidade pública e homenagens, é muito alto. Eles poderiam fazer o que fazem com muito menos dinheiro.
E além do mais, eles tendem o tempo todo a aumentar as condições de trabalho, como mais verbas e condições para os gabinetes. Tudo isso para beneficiar a reeleição, de modo que vereador se torna quase uma profissão; eles passam a ser políticos profissionais. É sempre importante na democracia que haja renovação, rotatividade.
E a população também não conhece os vereadores. Foi feita uma pesquisa pela Paraná Pesquisas que mostrou que cerca de 70% dos eleitores não conseguem apontar o nome de nenhum vereador de sua cidade. A grande maioria do eleitorado não se lembra em quem votou. E mais: quase 90% do eleitorado não conseguiram identificar nenhum projeto votado na Câmara Municipal, o que mostra o distanciamento e a falta de conhecimento sobre a Câmara dos Vereadores.

Comunicação: Por que existe essa suposta falta de interesse pelas atividades do vereador? A Câmara está distante da sociedade?

Oliveira: As pesquisas mostraram que a cidade desconhece o nome dos vereadores e não conhece os projetos votados, pois muitas vezes são projetos afastados dos interesses da grande maioria. Tirando a utilidade pública e as homenagens, nós vemos que a Câmara discute pouco. Os vereadores representam bairros ou áreas da cidade, e isso é importante, pois eles passam a ser conhecidos e a ter uma relação mais direta com os eleitores. Já outros vereadores constroem uma estrutura fisiológica de clientelismo, e são conhecidos por poucos grupos; é uma relação quase que privada com alguns eleitores. Nós temos grandes cidades, como Curitiba, com eleitorado muito grande, superior a um milhão de habitantes, e a gente observa que os vereadores não conseguem se relacionar com a grande maioria da população.
E é importante o papel do vereador como promotor ou formulador de políticas públicas e sociais. Ou seja, eles deveriam trabalhar na área do transporte público, na questão viária e na questão da saúde, mas o grande objetivo deles é tentar se reeleger.

Comunicação: E é mais correto que os vereadores mantenham esse vínculo com o bairro ou que legislem pela cidade inteira?

Oliveira: Alguns mantêm um vínculo tradicional, são considerados vereadores de bairros. Outros já têm a cidade como um todo; e há os que migram, ou seja, investem dinheiro na campanha em um bairro e a votação vai para outro lado da cidade.
Há também a questão do abuso do poder econômico. Alguns candidatos com muito dinheiro e que utilizam grandes volumes de investimentos na campanha têm mais benefícios e grandes vantagens. A Justiça Eleitoral deve estar atenta de modo a tentar coibir ou, pelo menos, diminuir a influência do poder econômico (durante a campanha). As denúncias de abuso de poder econômico sempre têm de ser investigadas pela sociedade.

Comunicação: Existe uma tendência de que esse panorama (a da eleição dos candidatos que mais investem em campanha) se altere para os próximos anos? Pois, nesse ano, tivemos alguns candidatos eleitos que não eram tão conhecidos assim, como o candidato Professor Galdino, do Partido Verde.

Oliveira: Exatamente. Mas é uma minoria. O caso do Professor Galdino foi interessante porque ele já vinha de duas eleições. E ele fez um trabalho braçal intensivo na área central, principalmente no calçadão da Rua XV, conseguindo, assim, se destacar. Sendo um professor, sem muito dinheiro, ele passou a compor a galeria de personalidades folclóricas do centro de Curitiba, ao lado do “Oil Man” e de outras figuras. Então, é claro, ele ficou conhecido, apresentou sua proposta e foi eleito. Mas a gente observa que a renovação é limitada.
Nós tivemos vinte vereadores reeleitos, dentre os 38, e 18 eleitos, e muitos (eleitos pela primeira vez) têm vínculos com poderes tradicionais. É o caso, por exemplo, do Algaci Túlio, que já tinha sido vereador, deputado e até mesmo prefeito em exercício, quando foi vice do Cássio Taniguchi. Não se pode dizer que tenha sido uma renovação. Ou então, as bancadas de filhos de políticos, tradicional elemento que conecta relações de parentesco e poder político, um dos traços mais marcantes da política paranaense, muito centrada no familismo. Também entrou na Câmara Municipal Omar Sabag Filho, que é um engenheiro e filho de um outro ex-prefeito de Curitiba, ou o Juliano Borgeti, do PP, irmão da deputada estadual Cida Borgeti que, por sua vez, é casada com Ricardo Barros, deputado federal que é irmão do prefeito de Maringá Silvio Barros, também os dois filhos de ex-prefeito.
Há o Jhonny Stica, do PT, que é um arquiteto com boas idéias, mas filho de Natálio Stica, que foi vereador, deputado e que, atualmente, está trabalhando na Sanepar. Também temos o caso da Renata Bueno, filha do líder do PPS no Paraná, Rubens Bueno, ex-deputado e muitas vezes candidato. Então, quando não é o próprio nome, você vê a reprodução através de seus parentes. Essa renovação, portanto, deve ser vista com muita cautela, porque significa mais dos mesmos.

Comunicação: O candidato eleito com o menor número de votos nas eleições desse ano foi Dirceu Moreira, do PSL, com 2.593 votos. 41 candidatos obtiveram mais votos do que ele e não foram eleitos.

Oliveira: Exatamente, o Dirceu Moreira entrou pela sua coligação. O candidato que teve a maior votação e não se elegeu foi o Sandoval, do PTB, com 7.180 votos. O que aconteceu é que o candidato a prefeito pelo PTB Fábio Camargo foi mal nas eleições e puxou pra baixo a votação dos vereadores do PTB. Mas é essa a maneira pela qual o sistema está estruturado. Muitos candidatos tiveram grandes votações e não entraram em função da legenda e das coligações. O PTB não elegeu ninguém. E o candidato mais votado foi o (Roberto) Accioly, acusado pela imprensa de estar envolvido em um assassinato, o que também abriu um grande debate na sociedade, já que isso não tinha sido comentado durante a campanha.
Nós vemos que é preciso conhecer melhor o perfil dos candidatos e ter informações antes que eles sejam eleitos. Há casos de políticos como o Belinati, em Londrina, um típico político ficha suja que continua sempre com uma grande votação na cidade. Deve-se mudar a cultura política do eleitor de modo a qualificar ainda mais o perfil de sua formação.
Ainda nessa legislatura, de 2005 a 2008, houve nepotismo. Agora, em função da decisão do STF, e também da vergonha que está se tornando a prática, a própria Câmara Municipal demitiu os nepotes ao longo da legislatura. Devido à pressão popular, da imprensa e do Ministério Público hoje já não há nepotismo na Câmara Municipal. Isso mostra que o eleitor pode ficar otimista, pois a sociedade civil organizada muda a cultura política e melhora as instituições.

Comunicação: Em alguns países, como Portugal, o vereador exerce função executiva. Nem em todos os países, portanto, ele exerce função legislativa. Qual a diferença entre essas duas atribuições?

Oliveira: É que no caso de Portugal, o presidente da Câmara exerce a função do executivo. Aqui no Brasil nós temos uma tradição da hipertrofia e da hiperatividade do Executivo. Ele é o principal poder e o Legislativo é o poder subalterno. Tudo o que venha do prefeito geralmente é aprovado nas Câmaras Municipais. É o que foi chamado de “Pacto Homologatório”. A Câmara aprova tudo e, por sua vez, o prefeito oferece boas condições de remuneração para os vereadores. As Câmaras, como eu já havia dito, recebem muito recurso pelo que elas fazem. Esses recursos poderiam ser investidos na área social, de educação, de saúde, transporte e moradia, e não nos vereadores. Temos sempre que tentar limitar essa condição, para que os vereadores possam fiscalizar, criticar, deliberar e ter uma relação respeitosa com o Executivo, que é o que não acontece no Brasil.

Comunicação: É importante para o candidato ter experiência no legislativo antes de concorrer a um cargo no executivo?

Oliveira: Não necessariamente. Nós podemos ter muitos dirigentes que têm um grande perfil administrativo no Executivo e que nunca passaram pelo Legislativo. O Jaime Lerner, por exemplo, foi prefeito de Curitiba várias vezes, além de governador do estado por duas vezes, e nunca teve nenhum cargo no Legislativo. Já outros políticos, como Roberto Requião, Álvaro Dias e Beto Richa, já passaram pelos dois poderes. Então, depende muito do perfil de cada personagem.

Comunicação: Durante o horário eleitoral gratuito, o candidato a vereador possui um espaço ínfimo para a apresentação de suas propostas. Isso não prejudica os candidatos? Por que o sistema de propaganda foi desenvolvido dessa forma? E a culpa é da legislação eleitoral ou dos próprios partidos?

Oliveira: Eu acho que a culpa é de todos, porque não é possível conhecer bem todo mundo devido ao grande número de candidatos. Nós tivemos quase 800 candidatos a vereador em Curitiba, para 38 vagas. É uma avalanche de informações, de rostos, de idéias, às vezes uns querendo aparecer mais do que os outros, e isso não permite um conhecimento das propostas, dos planos de governo ou do perfil. É a sociedade do espetáculo. Todos querem aparecer. Seria interessante um voto mais ‘distritalizado’. Você, no seu bairro, vota nos candidatos que representariam o seu bairro. Você teria mais conhecimento, mais proximidade e uma relação mais direta do que candidatos que saem coletando votos num município de mais de um milhão de eleitores. Há uma subrepresentação de vários bairros e de vários conjuntos eleitorais em Curitiba.

Comunicação: Muitas vezes o vereador promete que irá fazer isso ou aquilo caso seja eleito, mas algumas promessas não estão além da alçada do vereador, já que dependem da maioria da Câmara para serem aprovadas? E o eleitor acredita nessas propostas?

Oliveira: Muitos prometem as coisas mais absurdas e abstratas e que não dependem do Poder Legislativo. É preciso que o candidato conheça o papel do vereador, para não ser um vereador clientelista, mas um vereador que contribua para o planejamento urbano e o desenvolvimento social e cultural da cidade. Que investigue e fiscalize sempre o executivo, cobrando transparência.
Ainda hoje, não há na Internet o nome de todos os funcionários da Câmara Municipal, nem da Assembléia Legislativa. A transparência é muito importante. Saber quais são os assessores nos gabinetes dos vereadores e dos deputados estaduais. Paraná e Curitiba estão atrasados nesse quesito. É importante também o vereador trabalhar na área de educação, saúde, transporte, meio ambiente. A cidade de Curitiba possui um meio ambiente muito deteriorado. Na área cultural já tivemos elaboração de leis muito interessantes. O papel do vereador deve ser muito dinâmico e bem formado, não pode ficar apenas em utilidade pública e homenagens que não tenham relevância alguma para a cidade.


Matéria veiculada no site do Jornal Comunicação On-line no dia 27/10/2008.
Link para a reportagem: http://www.jornalcomunicacao.ufpr.br/node/5254

terça-feira, 16 de setembro de 2008

O público não perdoa

O dia parece encaminhar-se para aquele momento. Nada do que aconteceu antes, nenhum feito histórico ou ato de bondade serão considerados como atenuantes no julgamento popular. As pernas bambeiam, o rosto enrubresce, a temperatura sobe repentinamente e suas entranhas parecem duelar entre si. Todos os olhares o fuzilam e as mentes parecem gritar julgamentos precipitados enquanto você, pobre coitado, busca, mesmo sob imensa pressão, um subterfúgio para desviar a atenção alheia. Infelizmente, você não consegue fazer o tempo voltar alguns segundos, ou tranportar seu corpo para longe daquele recinto ou até mesmo apagar os últimos instantes da memória de todos.
Nada disso, entretanto, parece fazer algum sentido quando se retoma a razão e os seus órgãos sensoriais voltam a funcionar. Pelo resto da sua vida você lembrará, com um embrulho no estômago, do maldito momento em que afirmou com confiança:
- E o elefante caiu na lama!
E, impiedosamente, ninguém riu.